sábado, 12 de novembro de 2011

Trechos do livro ( Ao encontro das sombras)


A utilidade do inútil
Gary Toub

Há mais de dois mil anos, o filósofo taoísta Chang Tse escreveu várias parábolas exaltando as virtudes dos homens inúteis, feios e deformados – corcundas, aleijados e lunáticos – e das árvores nodosas, retorcidas e sem frutos. Uma dessas parábolas é a seguinte.

Shih, o carpinteiro, viajava para a província de Chi. Ao chegar a Chu Yuan, viu um carvalho ao lado do altar da vila. A árvore era grande o bastante para dar sombra a muitos milhares de bois e tinha centenas de palmos de circunferência. Elevava-se acima das colinas, com seus galhos mais baixos a mais de dois metros do solo. Uma dúzia de seus galhos eram grandes o suficiente para que deles se construíssem barcos.
Debaixo dela havia uma multidão, como num mercado. O mestre-carpinteiro não voltou a cabeça, continuou  em frente sem se deter.
Seu aprendiz lançou um longo olhar ao carvalho, depois correu atrás de Shih, o carpinteiro, e disse: “Mestre, desde o dia em que peguei meu machado e o segui, nunca vi madeira tão bela como essa. Mas o senhor nem sequer parou para olha-la. Por quê, mestre?”
Shih, o carpinteiro, respondeu: “Silêncio! Nem mais uma palavra! Aquela árvore é inútil. Um barco feito com sua madeira afundaria, um caixão logo apodreceria, uma ferramenta racharia, uma porta empenaria e uma viga teria cupins.É madeira sem valor e para nada serve. Por isso alcançou idade tão avançada.”
Depois que Shih, o carpinteiro, voltou para casa, o carvalho sagrado apareceu-lhe num sonho e lhe disse: “Com quem me comparas? Comparas-me com árvores úteis? Existem cerejeiras, macieiras, pereiras, laranjeiras,limoeiros,toranjeiras e muitas outras árvores frutíferas. Logo que seus frutos amadurecem, elas são despojadas e maltratadas. Os galhos maiores são cortados, os menores arrancados. Sua vida é mais amarga por causa da sua utilidade. É por isso que elas não vivem seu tempo natural de vida; são cortadas na primavera da vida. Elas atraem a atenção do mundo do comum dos mortais. Assim se passa com elas as coisas. Quanto a mim, há muito tento ser inútil. Quase fui destruída, diversas vezes. Finalmente sou inútil e isso é muito útil para mim.Se eu tivesse sido útil, teria conseguido crescer tanto assim?
“ Além disso, você e eu somos ambos coisas. Como pode julgar outra coisa? O que pode um homem mortal e inútil como você saber sobre uma árvore inútil?” Shih, o carpinteiro, despertou e tentou compreender o sonho.
Seu aprendiz lhe perguntou: “ Se aquela árvore tinha tão grande desejo de ser inútil, por que iria ela servir como altar?”
Shih, o carpinteiro, disse: “ Silêncio! Nem mais uma palavra! Ela está apenas fingindo ser inútil para não ser ferida por aqueles que não sabem que ela é inútil. Se não tivesse se transformado numa árvore sagrada, ela certamente teria sido derrubada.
Ela se protege de uma maneira diferente das coisas ordinárias. Não conseguimos compreende-la se a julgarmos do modo ordinário.”
(...)



 Inutilidade e individualidade

Além de nos ensinar a valorizar nossas doenças, as parábolas de Chang Tse nos dizem que, para desenvolver nosso pleno potencial, precisamos nos tornar inúteis para o mundo. Caso contrário, viveremos vidas amargas e insatisfeitas, maltratados e despojados de partes preciosas da nossa personalidade. A seu modo exagerado,Chung Tse está nos dizendo para vivermos como seres individuais.
Jung também enfatizou a importância de vivermos a singularidade da nossa vida. O elemento-chave no processo de individuação é o desenvolvimento da personalidade própria enquanto a vida na coletividade. Jung sentia uma inquietação específica a respeito da situação crítica do indivíduo na sociedade moderna;pois observou que, no instante em que o individuo se associa a massa, sua singularidade é diminuída e obscurecida. (Como Jonande Jacobi indicou em The Way ---Individuation O Caminho da individuação)

É demasiado grande o número de pessoas que não vivem suas próprias vidas e geralmente quase nada conhecem de sua verdadeira natureza. Elas fazem um esforço violento para “se adaptar”, para não se diferenciar de nenhum modo, para fazer exatamente aquilo que as opiniões, regras, regulamentos e hábitos do ambiente exigem como sendo “ o certo”. Elas são escravas “daquilo que os outros pensam”, “daquilo que os outros fazem”, etc.

(...)


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